O Supremo Tribunal Federal (STF), ao se debruçar sobre o tema 725 da Repercussão Geral, fixou a tese de que “É lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas, mantida a responsabilidade subsidiária da empresa contratante”.
A decisão, portanto, considerou lícita a terceirização em todas as etapas do processo produtivo, seja sobre a atividade meio ou fim, observando-se a alteração realizada na reforma trabalhista.
Diante da validação da possibilidade de terceirização da atividade fim, inúmeras empresas e empregadores se valeram de ações rescisórias para tentar desconstituir as decisões que reconheceram o vínculo de emprego direto do empregado com a tomadora de serviços.
Referidas ações foram interpostas, em decorrência de constar na decisão da ADPF 324 que o julgado “não afeta automaticamente os processos em relação aos quais tenha havido coisa julgada”, motivo pelo qual houve a necessidade da Suprema Corte, através do julgamento dos embargos declaratórios RE 958.252, por maioria de votos, modular os efeitos da tese jurídica que declarou a licitude da terceirização na atividade-fim.
Assim, a decisão aclaratória diz que somente os processos que estavam em curso na data da conclusão da ADPF 324 serão afetados pelos efeitos jurídicos da nova modulação, não havendo, portanto, a possibilidade de interposição de ações rescisórias sobre decisões anteriores a 30 de agosto de 2018 que questionem a aplicação da a Súmula 331 do TST.
Neste aspecto, há que se apontar discordância quanto à modulação estabelecida, visto que a ação rescisória tem por finalidade contestar a sentença que transita em julgado, inclusive quando a referida decisão for fundamentada em lei considerada inconstitucional, o que claramente trata-se do caso em debate.
Observa-se que os §12 e 15, do artigo 525, do CPC, assim dispõem:
§ 12. Para efeito do disposto no inciso III do § 1º deste artigo, considera-se também inexigível a obrigação reconhecida em título executivo judicial fundado em lei ou ato normativo considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, ou fundado em aplicação ou interpretação da lei ou do ato normativo tido pelo Supremo Tribunal Federal como incompatível com a Constituição Federal , em controle de constitucionalidade concentrado ou difuso.
(…)
§ 15. Se a decisão referida no § 12 for proferida após o trânsito em julgado da decisão exequenda, caberá ação rescisória, cujo prazo será contado do trânsito em julgado da decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal.
Portanto, diante da legislação vigente, ao declarar válida a terceirização sobre a atividade-fim, nos autos da ADPF 324, operou-se a possibilidade da parte em buscar a rescisão daquela decisão antes transitada em julgado.
Neste aspecto consignou o Ministro Barroso no voto divergente nos autos do RE 958.252:
Portanto, a vontade do legislador foi a de afastar a imutabilidade da sentença, de modo a não prevalecer a coisa julgada inconstitucional. E, desde o trânsito em julgado da ADPF 324, já se faz possível o ajuizamento de ações rescisórias que tenham por objeto o entendimento firmado por este Tribunal sobre a constitucionalidade da terceirização.
Com relação a modulação em si, também se faz necessário apontar discordância quanto ao prazo temporal fixado, ou seja, 30/08/2018.
Como se sabe, as leis 13.429 (terceirização) e 13.467 (reforma trabalhista) , que entraram em vigor no ano de 2017, já destacavam que as empresas poderiam terceirizar qualquer atividade desde que garantidas as devidas proteções, veja-se:
Art. 2º A Lei nº 6.019, de 3 de janeiro de 1974 , passa a vigorar com as seguintes alterações:
“Art. 4º -A. Considera-se prestação de serviços a terceiros a transferência feita pela contratante da execução de quaisquer de suas atividades, inclusive sua atividade principal, à pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviços que possua capacidade econômica compatível com a sua execução.
Nestes termos, em que pese a decisão da ADPF 324 tenha se operado em 30/08/2018, entendo que a data correta, em decorrência da maioria formada no julgamento do RE 958.252, seria 11/11/2017, mais precisamente a entrada em vigor da reforma trabalhista.
Outra questão sobre a terceirização que vem gerando repercussão resulta da decisão proferida pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) nos autos do processo RR-10709-83.2018.5.03.0025, que condenou empresas no ramo de construção civil ao pagamento de indenização por dano moral coletivo pela contratação de empresas prestadoras de serviços com capital social incompatível com o número de empregados.
O artigo 4-B, alíneas “a” a “e”, da Lei nº 6.019/74, regulamenta o capital social mínimo que a empresa prestadora de serviços deve possuir para seu funcionamento, observando, respectivamente, o número de empregados:
Art. 4o-B. São requisitos para o funcionamento da empresa de prestação de serviços a terceiros:
(…)
a) empresas com até dez empregados – capital mínimo de R$ 10.000,00 (dez mil reais); (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
b) empresas com mais de dez e até vinte empregados – capital mínimo de R$ 25.000,00 (vinte e cinco mil reais); (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
c) empresas com mais de vinte e até cinquenta empregados – capital mínimo de R$ 45.000,00 (quarenta e cinco mil reais); (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
d) empresas com mais de cinquenta e até cem empregados – capital mínimo de R$ 100.000,00 (cem mil reais); e (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
e) empresas com mais de cem empregados – capital mínimo de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais). (Incluído pela Lei nº 13.429, de 2017)
Como já mencionado no presente artigo, a nova redação da CLT já previa a licitude da terceirização em sua totalidade, entretanto, o legislador tomou o cuidado de garantir algumas proteções, sendo que uma delas versa sobre o capital social mínimo da empresa prestadora de serviços.
Tal fato foi observado no acórdão proferido, visto que os Ministros que compõem a 6ª Turma do C. TST destacaram que condenação ao dano moral coletivo se faz necessária, posto que ao deixarem de observar a legislação vigente, as empresas Tomadoras auferiram vantagens indevidas de mercado sobre aquelas que cumprem estritamente a Lei.
Por se tratar de acórdão proferido por uma das turmas do TST, há que se ressaltar que tal decisão não possui efeito vinculante, entretanto, não se pode destacar possível reflexo no entendimento adotado pelas varas do trabalho ou nos Tribunais Regionais, inclusive quanto a declaração do vínculo direto por suposta terceirização ilícita,
Por fim, a discussão referente o tema Terceirização ainda irá gerar inúmeras discussões jurídicas, visto que ainda não houve a uniformização da jurisprudência por parte dos Tribunais Regionais do Trabalho e do próprio Tribunal Superior do Trabalho, vide as decisões quanto a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços em caso de transportes de mercadorias, mas este tema ficará para um próximo estudo.
Com coautoria de Lupercio Darcadia