Um levantamento feito pela equipe da XP Asset Management aponta que os dados oficiais de emprego no país podem estar errados.
O estudo argumenta que, com os processos de entrevistas alterados pela pandemia, os dados de mercado de trabalho oficiais podem estar subestimando a recuperação e mostrando uma taxa de desemprego maior do que a que de fato está acontecendo.
Com isso, as estimativas de renda total do país (medida pela massa salarial) também estariam menores do que os valores reais.
Diante disso, a XP argumenta que se o emprego e a renda estão maiores do que mostram as estatísticas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as bases para a retomada da economia em 2021 podem estar mais robustas do que o inicialmente imaginado, mesmo sem o auxílio emergencial.
Análise de indicadores
O relatório analisou as duas principais pesquisas sobre o mercado de trabalho no Brasil, ambas mensais. A principal delas é a Pnad Contínua, feita pelo IBGE, que estima a quantidade de todos os trabalhadores do país e calcula a taxa oficial de desemprego.
A outra, complementar, é o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que é feito pela Secretaria Especial do Trabalho e acompanha apenas a evolução dos empregos com carteira assinada.
Embora com diferenças metodológicas, as duas sempre andaram mais ou menos juntas. Do início da pandemia para cá, porém, começaram a seguir caminhos bem diferentes. A Pnad, do IBGE, mostra um tombo muito maior do que o Caged no número de trabalhadores com carteira, seguida de uma recuperação mais fraca.
Pela Pnad, o Brasil ainda tinha em outubro (dado mais recente) 4 milhões de empregados registrados a menos que em fevereiro, último mês antes da pandemia. Era um nível 11,4% menor que o patamar pré-crise.
Já pelo Caged, eram 583 mil empregados a menos ou 1,5% abaixo do nível de fevereiro. Os dados foram calculados e dessazonalizados para cada mês pela XP a partir das informações das pesquisas.
Desde o início da pandemia, as entrevistas feitas pelo IBGE sobre o mercado de trabalho deixaram de ser presenciais e passaram a ser feitas por telefone. O Caged, por sua vez, utiliza as bases de registro das empresas junto ao Ministério da Economia para contar o total de contratados e demitidos por mês.
Desemprego menor
“Não é uma crítica ao IBGE, mas parece haver claramente um problema amostral que está fazendo a Pnad capturar uma piora no mercado de trabalho formal que não ocorreu”, disse o economista-chefe da gestora da XP, Fernando Genta, que também foi secretário-adjunto de macroeconomia no Ministério do Trabalho entre 2016 a 2018.
“Se olharmos para o Caged, vemos que o emprego não caiu tanto quanto a Pnad mostra e, consequentemente, que a taxa de desemprego também pode não ter subido tanto quanto a Pnad sugere.”
De acordo com os cálculos feitos por Genta, a taxa de desemprego, que estava em 14,3% em outubro, seria na verdade de 13,8% se a pesquisa do IBGE tivesse continuado a acompanhar a mesma tendência do Caged.
Já o número total de empregados com carteira assinada no país seria 3,5 milhões maior do que o divulgado (ou seja, seria de 34,5 milhões em vez de 31 milhões), e a massa salarial estaria subestimada em R$ 8 bilhões (logo, seria de R$ 216 bilhões em vez de R$ 208 bilhões). Para se ter uma ideia, a diferença é mais que o triplo do que é recebido por mês em Bolsa Família (de R$ 2,5 bilhões, na média).
A massa salarial é a soma dos ganhos mensais de todos os trabalhadores do país e é a medida da renda total disponível na economia para consumo ou poupança.
Desemprego recorde com contratações recordes
O desemprego no país atingiu em outubro o maior nível da série histórica, que começa em 2012, de acordo com a Pnad Contínua. Na média de agosto a outubro, a taxa de desocupação foi de 14,6%. O número é diferente do da XP (de 14,3%) porque a corretora faz a conta de quanto teria sido o desemprego apenas em outubro, enquanto o IBGE divulga na Pnad uma média trimestral.
Já o Caged, em outubro, registrou um saldo de 395 mil novas vagas com carteira assinada no país, o melhor mês desde 1992, de acordo com o Ministério da Economia.
Genta, da XP, explica que só é possível fazer a estimativa de possíveis desvios na Pnad do IBGE para o grupo de trabalhadores com registro em carteira, já que, para esses, há também a pesquisa complementar do Caged para fazer comparações.
A Pnad Contínua, porém, é mais completa e considera ainda trabalhadores que atuam como autônomos, empregadores e empregados domésticos, tanto formais quanto informais. “Para esses, não há nenhuma outra base de comparação; os números deles podem tanto estar subestimados quanto supermestimados”, disse o economista.