O avanço da tecnologia transformou profundamente a forma como interagimos, realizamos transações e nos expressamos. Com isso, novos desafios jurídicos surgiram, demandando uma regulamentação específica para o ambiente digital. O Direito Civil Digital, um marco importante trazido inicialmente no Relatório Final do Código Civil, visa fortalecer direitos e garantias fundamentais, assegurando a proteção da dignidade das pessoas e a segurança de seu patrimônio no cenário digital.
O Livro Direito Civil Digital do Relatório visa a estabelecer um conjunto de normas para regular as relações e atividades que ocorrem no ambiente digital, definindo-o como um espaço virtual interconectado pela internet, englobando diversas tecnologias interativas. Seus fundamentos incluem o respeito à privacidade, liberdade de expressão, inclusão social, desenvolvimento tecnológico e o efetivo respeito aos direitos humanos.
Apesar de haver diversas legislações que tratam sobre a pessoa no ambiente digital, o Relatório traz um capítulo mais abrangente, reconhecendo os direitos das pessoas naturais e jurídicas no ambiente digital, garantindo o reconhecimento de identidade, proteção de dados pessoais, liberdade de expressão, acesso à justiça em casos de violação de direitos, e o direito à exclusão de dados pessoais. Porém, uma novidade legislativa se dá à desindexação de informações inadequadas em mecanismos de busca, permitindo que o titular possa requerer a desindexação por meio de requisitos claros para sua concessão, independente de ordem judicial.
Define-se situação jurídica digital como toda interação no ambiente digital que resulte em responsabilidades, direitos e deveres entre pessoas naturais, jurídicas e entidades digitais. Essas situações estão sujeitas à legislação brasileira, normas das plataformas digitais e princípios como boa-fé e transparência.
No Capítulo IV, intitulado “Direito ao Ambiente Digital Transparente e Seguro”, são delineadas medidas para promover um ambiente digital seguro e confiável, fundamentado nos princípios de transparência, boa-fé e prevenção de danos. Isso implica que as plataformas digitais devem adotar medidas de segurança e práticas de moderação de conteúdo que respeitem a não discriminação, a liberdade de expressão e a diversidade de opiniões.
É crucial que as plataformas digitais demonstrem a implementação de medidas diligentes para garantir a conformidade de seus sistemas e processos com os direitos de personalidade, bem como os direitos à liberdade de expressão e informação. Isso inclui a realização de avaliações de riscos sistêmicos para mitigar e prevenir danos.
Ademais, determina-se que as plataformas digitais podem ser responsabilizadas tanto administrativa quanto civilmente nos casos em que devam reparar os danos resultantes de conteúdos produzidos por terceiros, distribuídos por meio de publicidade da plataforma, ou nos casos de danos decorrentes de conteúdos gerados por terceiros em situações de repetido descumprimento dos deveres e obrigações estipulados, estando sujeitas ao sistema de responsabilidade civil estabelecido e delineado.
Um ponto relevante diz respeito ao artigo 19 do Marco Civil da Internet (MCI), que estipula a necessidade de ordem judicial para remoção de conteúdo. Em contrapartida, o Relatório propõe que essa obrigação seja direcionada diretamente aos provedores. No entanto, mesmo com a redação atual do art. 19 do MCI, não impede que os provedores, de forma proativa, realizem a retirada assim que identificado o conteúdo explicitamente ilícito.
No entanto, a questão torna-se complexa quando se trata de responsabilidade, pois, embora a responsabilidade pela análise e remoção de conteúdo recaia sobre os provedores, e não mais exclusivamente sobre o poder judiciário, reconhecendo a importância de combater discursos de ódio e desinformação, além da proteção aos princípios como não discriminação, liberdade de expressão e pluralidade de ideias, atribuir essa decisão aos provedores pode resultar na exclusão arbitrária de conteúdo legítimo.
Outro avança trazido no Relatório diz respeito ao patrimônio digital, o qual compreende ativos intangíveis e imateriais pertencentes a indivíduos ou entidades, incluindo dados financeiros, contas de mídia social, criptomoedas e conteúdos digitais. A tão falada Herança Digital estaria regulamenta, sendo a transmissão hereditária desses ativos, garantindo o direito à exclusão de contas e à proteção dos direitos de personalidade, mesmo após a morte.
No que se refere à criança e ao adolescente em ambiente digital, visa garantir a proteção integral, estabelecendo deveres para os provedores de serviços digitais, como a implementação de sistemas de verificação de idade e a proibição de publicidade dirigida a esse público.
Por fim, o Livro de Direito Civil Digital no Relatório do Código Civil surge como uma resposta aos desafios trazidos pela sociedade digital, buscando assegurar direitos e garantias fundamentais no ambiente online. Por meio de dispositivos que abordam desde a proteção de dados até a herança digital e a proteção de crianças e adolescentes, este código visa promover uma convivência mais segura, transparente e ética no mundo digital.