A promoção da equidade e inclusão no ambiente de trabalho tem ganhado relevância no debate público e privado. Mais do que princípios éticos ou compromissos formais, esses conceitos estão diretamente ligados ao desenvolvimento sustentável das empresas e à criação de ambientes corporativos mais produtivos, inovadores e justos.
A diversidade nas equipes, quando bem gerida, traz novas perspectivas e potencializa a criatividade e a inovação e esse cenário é amplamente defendido por organismos internacionais como a ONU, que incluiu o tema na agenda global através dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
O ODS 5, por exemplo, destaca a importância de alcançar a igualdade de gênero e empoderar mulheres e meninas em todos os setores da sociedade, incluindo o mercado de trabalho. No Brasil, as discussões sobre equidade de gênero, raça e inclusão no mercado de trabalho também foram reforçadas por legislações como a Lei 14.611/2023, que regulamenta a igualdade salarial entre homens e mulheres.
Contudo, apesar da existência de leis que buscam promover a equidade, o impacto dessas normativas ainda é limitado. Um dos espaços onde essa limitação se reflete é nas Convenções Coletivas de Trabalho (CCTs) e nos Acordos Coletivos de Trabalho (ACTs).
Assim, a análise das cláusulas coletivas que tratam da inclusão e da diversidade, realizada pelo Bichara Advogados em parceria com o GRTS, revela que o avanço é ainda tímido e concentra-se em alguns temas específicos, como a igualdade salarial, enquanto outros, como a inclusão de mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+, recebem menos atenção.
A pesquisa apontou que, entre 2022 e 2024, houve um aumento significativo nas cláusulas relacionadas à igualdade salarial. Em 2024, 471 Acordos Coletivos mencionaram a igualdade salarial, enquanto apenas 46 trataram da inclusão de mulheres e 4 da inclusão racial. Esses números demonstram que, embora tenha havido progressos pontuais, a inclusão continua sendo uma exceção, e não uma regra, nas negociações coletivas.
Essa lacuna reflete uma série de desafios. Um dos fatores que dificultam a inclusão de cláusulas robustas sobre equidade nas negociações coletivas é a percepção, por parte de muitas empresas, de que esses temas são menos prioritários frente a questões financeiras imediatas, como reajustes salariais ou benefícios de curto prazo.
Muitas empresas veem a implementação de políticas de inclusão como um custo adicional que, no curto prazo, não traria benefícios concretos e essa visão é reforçada pela falta de pressão externa para que essas mudanças ocorram.
A legislação, por mais que avance, ainda depende da ação ativa das empresas para ser efetivamente implementada, e muitas delas optam por fazer o mínimo exigido por lei, sem maiores investimentos em programas que promovam uma verdadeira inclusão no ambiente de trabalho.
Além do fator custo, há também a questão cultural. Muitas empresas ainda não internalizaram a importância estratégica da diversidade para o seu próprio crescimento. Isso cria um ciclo vicioso: a falta de incentivos concretos, associada à visão de que a inclusão é um tema periférico, faz com que as cláusulas nas negociações coletivas sobre esses temas sejam genéricas e sem força prática.
Em grande parte, as cláusulas que tratam de equidade e inclusão em CCTs e ACTs apenas replicam o que já está previsto na legislação, sem estabelecer metas ou critérios claros para a sua aplicação. Na prática, essas cláusulas servem mais como um registro formal de intenção do que como um compromisso efetivo com a mudança.
Um exemplo claro dessa superficialidade está nas cláusulas que tratam da igualdade salarial. Embora muitos Acordos Coletivos mencionam a necessidade de garantir salários iguais para homens e mulheres que desempenhem as mesmas funções, poucas dessas cláusulas vão além da repetição da norma legal.
A falta de mecanismos de monitoramento e auditoria interna para verificar o cumprimento dessas disposições dificulta a fiscalização e, consequentemente, a efetivação da igualdade salarial no dia a dia das empresas.
Esse padrão se repete em outras cláusulas sobre inclusão racial, de gênero e de pessoas LGBTQIA+. Em vez de medidas concretas que incentivem a contratação e promoção de grupos sub-representados, essas cláusulas limitam-se a reafirmar a proibição de discriminação, sem prever ações afirmativas ou metas específicas.
A inclusão e equidade nos ambientes de trabalho, portanto, ainda enfrentam muitos desafios. No entanto, é possível avançar com algumas estratégias. Um dos caminhos seria o desenvolvimento de cláusulas mais detalhadas e propositivas nas negociações coletivas.
Em vez de simplesmente reiterar o que já está previsto na lei, as CCTs e ACTs poderiam estabelecer metas claras para a inclusão de mulheres, pessoas negras e LGBTQIA+ em cargos de liderança ou áreas dominadas por homens.
Essas metas poderiam ser monitoradas por comitês internos de diversidade, compostos por representantes das empresas e dos sindicatos, que se encarregariam de avaliar periodicamente os progressos feitos e sugerir ajustes.
Além disso, as empresas poderiam ser incentivadas a adotar políticas inclusivas por meio de benefícios fiscais ou outras vantagens nas negociações futuras.
Criar incentivos econômicos para as empresas que investem em diversidade é uma maneira eficaz de alinhar os objetivos de inclusão com as metas financeiras das organizações, quebrando a percepção de que inclusão representa apenas um custo. Essa abordagem poderia ser complementada por políticas públicas que premiem as empresas que se destacam na implementação de programas de diversidade e equidade.
Outro ponto crucial é a capacitação contínua dos gestores e colaboradores sobre a importância da diversidade. A inclusão só será efetiva se for incorporada à cultura organizacional, o que exige um esforço de conscientização.
Programas de treinamento que abordem a importância da diversidade, como lidar com vieses inconscientes e como criar ambientes de trabalho mais inclusivos, são fundamentais para que as empresas não apenas cumpram a lei, mas também adotem uma postura proativa em relação à inclusão e isso também pode ser perfeitamente abordado no âmbito de negociações coletivas.
Em resumo, a inclusão e a equidade no ambiente de trabalho dependem de mudanças estruturais nas negociações coletivas e na mentalidade das empresas.
As cláusulas que tratam desses temas precisam ser reforçadas com metas, mecanismos de monitoramento e incentivos concretos para que a inclusão deixe de ser uma promessa formal e se torne uma prática cotidiana nas empresas brasileiras.
Assim, as negociações coletivas podem e devem desempenhar um papel central nesse processo, ajudando a transformar o mercado de trabalho em um espaço mais justo, equitativo e inclusivo para todos.