Em 2020, diversas empresas adotaram as medidas de preservação de empregos que foram disponibilizadas pelo governo federal. Assim, foi possível preservar empregos em meio à pandemia. Mas a dúvida é sobre o que fazer agora que as medidas já terminaram.
Advogados trabalhistas ouvidos pelo G1 orientam empresas a fazer acordos ou negociações coletivas para manter quadro de colaboradores.
No ano passado, o governo lançou a medida provisória 927, que autorizava a adoção do banco de horas em caso de interrupção das atividades, implantação do teletrabalho sem necessidade de alteração no contrato de trabalho, antecipação de férias e de feriados, além da prevalência dos acordos individuais entre patrões e empregados sobre as leis trabalhistas, desde que não descumprisse a Constituição.
Outra medida foi o Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda (BEm), que teve a adesão de quase 10 milhões de trabalhadores no ano passado. Esse programa autorizou a redução de jornada e salário e suspensão de contratos de trabalho, com complemento das remunerações pelo governo e estabilidade pelo tempo equivalente à suspensão ou redução.
No final de janeiro, o secretário especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, Bruno Bianco, afirmou que o governo federal avaliava a possibilidade de prorrogação do BEm – e que poderiam ser propostas flexibilizações na legislação trabalhista, para aumentar a formalização de trabalhadores. Até o momento, no entanto, nenhuma das duas propostas foi em frente.
Com o fim da validade no final do ano passado, essas medidas, que tinham o objetivo de proteger o mercado de trabalho contra os impactos da pandemia de Covid-19, não podem mais ser implantadas pelas empresas.
Com o agravamento da pandemia e a implantação de fases mais restritivas de funcionamento para estabelecimentos do comércio e serviços em muitas cidades do país, como as empresas conseguirão evitar demissões de funcionários com a restrição de atividades e queda no faturamento?
Negociação coletivas de trabalho
De acordo com Ricardo Souza Calcini, professor da pós-graduação da FMU e especialista nas relações trabalhistas e sindicais, o caminho natural é buscar negociações coletivas de trabalho para encontrar alternativas.
Danilo Pieri Pereira, especialista em Direito e Processo do Trabalho e sócio do Baraldi Mélega Advogados, concorda com Calcini. “É possível negociar com os sindicatos todas essas medidas, inclusive a redução de jornada e salário, por meio de acordos e convenções coletivas”, afirma.
“É claro que uma nova medida provisória seria a solução legislativa ideal. Mas, enquanto isso não vem, representantes de empresas e funcionários podem negociar coletivamente, estabelecendo, por exemplo, banco de horas e redução de jornada e salário”, diz Eduardo Pragmácio Filho, doutor em Direito do Trabalho e sócio do Furtado Pragmácio Advogados.
Calcini ressalta que o empregador não pode fazer um acordo informal, como manter o funcionário em casa e não pagar o salário, por exemplo, porque vai contra o que determina a lei trabalhista.
“Empresas e empregados devem ficar cientes de que uma negociação individual flexibilizadora é ilegal e certamente acabará em ação trabalhista”, alerta Pragmácio Filho.
“Sem novas medidas provisórias, as empresas ficam totalmente desprotegidas, afinal, a legislação trabalhista vigente não está preparada para enfrentar o atual momento de crise ainda proporcionado pela Covid-19”, aponta Calcini.
Calcini diz que as alternativas hoje existentes para evitar demissões são as seguintes:
- suspensão dos contratos de trabalho, mediante a concessão de contrapartidas pelas empresas, via negociação coletiva;
- transformação dos contratos de trabalho para o sistema “part time”, ou meio período, com limite máximo de jornada semanal, com o aval do sindicato da categoria;
- implementação de lay-off, que deve ser aprovado em convenção ou acordo coletivo, que autoriza a empresa a suspender o contrato de trabalho, sem pagamento de salário, FGTS e INSS, por um período de dois a cinco meses, desde que ofereça aos empregados curso ou programa de qualificação profissional, com direito a uma bolsa paga pelo Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT);
- adoção das alternativas dispostas na MP 927 nos estados e municípios que, oficialmente, prorrogaram o estado de calamidade pública, como em Minas Gerais (decreto nº 48.102/2020), Paraná (decreto nº 6.543/2020) e Tocantins (decreto nº 6.202/2020);
- uso de férias e banco de horas;
- concessão de licenças remuneradas.
‘Empresa e trabalhador à própria sorte’
Para Pereira, o poder público deixa trabalhadores e empresas à própria sorte ao impedir atividades sem qualquer planejamento ou apoio.
“Aqueles que não conseguirem resistir à crise causada pelo fechamento compulsório tendem a ficar sem caixa para o pagamento de salários e até mesmo de verbas rescisórias, o que tende a acabar desaguando na Justiça do Trabalho. É uma verdadeira bola de neve”, comenta.
Pragmácio Filho defende que, para evitar uma onda de demissões, governo, empresas e centrais sindicais entrem em um entendimento, “com diálogo tripartite franco e amplo”.
“O ideal para os geradores de emprego, com destaque para as micro e pequenas empresas, é que busquem sempre o apoio jurídico de advogados especializados na legislação trabalhista brasileira para que as medidas sejam tomadas com amparo na lei e na jurisprudência”, diz Pereira.